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Duas noites com Julio Calasso
7 de setembro de 2017

DIRETOR JULIO CALASSO DEBATE LONGA CENSURADO NOS ANOS 1970 E DOCUMENTÁRIO SOBRE PLÍNIO MARCOS NA CINEMATECA CAPITÓLIO PETROBRAS

O diretor Julio Calasso vem a Porto Alegre debater duas sessões da programação da Cinemateca Capitólio Petrobras. No sábado, 9 de setembro, às 20h, ele conversa com o público após a exibição de Longo Caminho da Morte, dentro da mostra Cinema Novo – Brasil em Transe. Na terça-feira, 12 de setembro, às 20h, há um debate após a exibição de Plínio Marcos – Nas Quebradas do Mundaréu. A sessão faz parte da mostra Capitólio Em Cena, uma programação paralela dentro da 24ª edição do Porto Alegre Em Cena. As duas sessões têm entrada franca.

A mostra Cinema Novo – Brasil em Transe faz parte do projeto Cinemateca Capitólio – Digitalização e Programação Especial 2017, patrocinado pela Petrobras e financiado através do Pró-Cultura RS da Secretaria de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer do Estado do Rio Grande do Sul.

JULIO CALASSO

Paulistano de 1941, o diretor, ator e produtor artístico trocou o curso de Filosofia pelos Teatros Oficina e Arena, em 1964, e cinema, em 1965, onde se iniciou como assistente de Geraldo Sarno no emblemático documentário Viramundo. Três anos de exaustivo aprendizado em produção, roteiro e edição na antiga TV Excelsior deram o suporte para o mergulho no Bandido da Luz Vermelha, de Rogério Sganzerla, do qual foi produtor. Escreveu, produziu e dirigiu Longo Caminho da Morte, convidado a participar do Festival de Locarno e Nova Deli, em 1974. Foi proibido de participar pela censura. Produtor artístico de grupos musicais como Joelho de Porco, Novos Baianos, Moraes Moreira e Sindicato é o idealizador de mostras alternativas e itinerantes, como: Cinema Bandido, Cinema de Invenção, Cinema Negro e Cine Teatro Brasil. No Rio de Janeiro de 1998 a 2007 capturou as imagens de ousadíssimos espetáculos que resultaram em 3 documentários licenciados para a SESC TV e foram as sementes de uma narrativa de que “Nas Quebradas do Mundaréu” é o sumo.

FILMES

LONGO CAMINHO DA MORTE

1971, 85 minutos, Brasil.

O primeiro longa-metragem de Julio Calasso condensa uma visão profética, mística e política em uma mistura de tragédia e ópera burlesca do mundo atual. O filme é premonitório de grandes temas do cotidiano contemporâneo: desequilíbrio ecológico terminal, irracionalidade, absurdo dos sistemas políticos, reflexão sobre a decadência da fé e da vida no planeta.

Ambientado em uma fazenda em Serra Negra, no interior do estado de São Paulo, o filme é estrelada por Othon Bastos, Assunta Peres, Dionísio Azevedo, Cecília Thumin. O roteiro aborda a vida e morte do Coronel Orestes (Othon Bastos), fazendeiro de café decadente, que perpassa três gerações entre o desespero, as alucinações e o socorro de três esposas distintas, simultaneamente.

A cidade, síntese da modernização do país, (em)terra definitivamente o oligarca construindo prédios sobre o solo que, anteriormente, fizera o prestígio do personagem. O diretor escolhe abordar um período negligenciado até então, especialmente em tempos de irreverência e contracultura: a decadência da oligarquia rural. O retrato é cru, buscando raízes na ironia, no deboche ou nos excessos e acha que foi mais longe com uma narrativa ardilosa entre tradição e invenção.

Tudo vai acontecendo também sincronicamente entre nosso personagem e os caminhos que toma a narrativa. De um início clássico, quase “fordianamente” imóvel e sem palavras ao embaralhamento completo entre presente, passado e futuro, simultaneamente, repito.

Orestes é um personagem esquecido pelo tempo, um imortal que padece a cada instante. Ele é, simultaneamente, pai, avô e o filho que nunca teve.

Por sua vida, passaram (passam?) três esposas: Maria, a mais velha, das épocas da escravidão; Zina, professora de línguas, contratada como preceptora de uma criança que nunca existiu e Irene, a mais jovem e provavelmente a mais atual delas.

Todas as mulheres são açoitadas desde sempre nessa história superposta e hierarquizada, entre os delírios monarquistas de Orestes, apesar de sua impotência total diante da impossibilidade de um filho que não vem. Mulheres açoitadas, mas que chicoteiam os escravos da fazenda.

Essa completa instabilidade conduz ao seu fim em um discurso visionário sobre a destruição da humanidade, a poluição, a destruição dos valores, a desordem moral.

O filme conquistou o prêmio de melhor roteiro pela Associação Paulista de Críticos de Arte, o prêmio Governador do Estado (também roteiro) e Toda Crítica (longa-metragem de estreante).

Indicado para os festivais de Locarno e Nova Deli, foi proibido pela censura.

Recuperado em 2016 foi apresentado na mostra Cinema de Invenção (São Paulo e Rio de Janeiro) e também na Mostra Internacional Olhar de Cinema em Curitiba.

PLÍNIO MARCOS – NAS QUEBRADAS DO MUNDARÉU

Brasil, 2015, 90 minutos

É fruto de uma longa viagem entre evidências e obscuridades da arte e vida de Plínio Marcos. Uma cinebiografia frutificada depois de muito calo e aragem em terra esturricada. Conhecemos-nos há mais de 50 anos. Ele vinha de Santos e eu do teatro Oficina. Nos “trombamos” no teatro de Arena, onde atuei em sua primeira montagem em São Paulo: “Reportagem de um Tempo Mau”, com Walderez de Barros, Ney Latorraca, Claudio Mamberti e Célia Watanabe. O filme foi concebido a partir de uma miscelânea de 90 horas de material audiovisual das mais variadas origens, fontes, formatos e suportes: espetáculos, representações, filmes adaptados ou não de sua obra, depoimentos, entrevistas, canções, textos e poemas em 3.600 horas de edição e 500 de finalização de som e imagem. Tem 89 minutos de duração. O encadeamento e a costura das ideias de Plínio Marcos se dão através de várias montagens de peças e adaptações para o cinema de clássicos do dramaturgo, como “Abajur Lilás”, “Barrela”, “Dois Perdidos”, “Querô” e “Navalha na Carne”. Outras narrativas cinematográficas, como “BláBláBlá”, “O Bandido da Luz Vermelha” e “Viramundo” partilham do enredo, assim como o envolvimento de Plínio com o universo do samba paulista. O pontapé inicial desta cinebiografia foi dado em 1999, com o registro em mini-DV das montagens antológicas de um ousado grupo teatral CETE (Centro Experimental Teatro Escola, Rio de Janeiro) em homenagem ao Plínio recém falecido. De volta a São Paulo, grupos amadores fizeram uma série de espetáculos com seus textos nos porões da Maria Antonia, antiga Faculdade de Filosofia. Fui lá e gravei muito. No carnaval santista em 2008, Plínio Marcos recebeu homenagem da Escola de Samba X-9. Capturei tudo mas ainda não tinha um filme na cabeça. Quando brotou, eu sabia que tinha de proporcionar ao espectador uma viagem de emoções contraditórias; fui guiado pela obsessão de uma narrativa que correspondesse à ousadia transgressora da escrita de Plínio Marcos, onde estão presentes vestígios do circo teatro mambembe, do congraçamento mágico da tradição cigana e os ecos subliminares e supranaturais da Europa Central e da velha Grécia. Teatro filmado é um horror. Batalhar uma narrativa enviesada que envolvesse teatro, cinema, música e vídeo clip. Logrando jogar livre associação e sugestão contraditória, me afundei 3600 horas em uma ilha de edição e centenas na finalização e vários ediores. Tônia Carrero, Rogério Sganzerla, Vera Fischer, José Roberto Aguilar, Glauce Rocha, Geraldo Sarno, Gilberto Mendes, Geraldo Filme, Gilberto Gil, Nelson Xavier, Abujamra, Cartola, Caetano, Vanzolini, Emiliano Queiroz, Gero Camilo, Neville d’Almeida, X9, Marino Pinto, Vai Vai, Solano Trindade, Sergio Mamberti, Pedro Bandeira, Joelho de Porco e Leo Lama, entre tantos outros, dividem o “palco” com o saudoso protagonista do documentário.

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