Comunidades indígenas gaúchas lançam projeto visual e musical sobre as águas
Novo álbum musical e visual Goj tej e goj ror, as águas são nossas irmãs trata das águas desde a cosmologia Kaingang. Projeto inclui lançamentos em Porto Alegre, Brasília e nas próprias comunidades indígenas de Nonoai e Canela, onde foi criado, e integra o Natura Musical.
A produtora gaúcha Tela Indígena desenvolveu por meio de laboratórios artísticos e estúdios de gravação nas comunidades indígenas Kaingang de Nonoai e Canela (RS), o projeto de um novo álbum musical e visual com canções inéditas e tradicionais de autoria indígena. O álbum Goj tej e goj ror, as águas são nossas irmãs nasce do encontro de diferentes gerações para dialogar e cantar sobre e para as águas.
A temática vem da atual crise hídrica brasileira e a importância de preservar e valorizar a água, além dos territórios e cultura Kaingang. A concepção, indicação e seleção das 19 faixas foi realizada pelos Kaingang em cada um dos territórios e os laboratórios artísticos e interdisciplinares reuniram kujá (pajés), músicos, artistas visuais e produtores culturais não indígenas, nos territórios Konhún Mag, em Canela, e Nürvenh, em Nonoai, entre outubro/22 e janeiro/23.
O repertório é composto por músicas inéditas criadas e gravadas para o próprio álbum, em que os indígenas se inspiraram durante o período de laboratório, e outras canções tradicionais, passadas de geração em geração, que remetem ao gufã (tempo antigo e mítico, geralmente a ver com a flora, rios, território, alimentos e animais presentes nas histórias). Entre os instrumentos utilizados estão o violão taquara, chocalho, flauta de bambu e apito. “Nasci neste rio lindo que vem tentando sobreviver e a música que canto conheci com meu avô”, diz Iracema Gah Teh, 59 anos, líder indígena e kujá envolvida em toda realização do álbum. Em cada faixa é também muito presente os sons das águas de rios, lagos e cachoeiras, pelo motivo de os indígenas se sentirem mais inspirados a cantar sobre a água estando perto ou dentro dela.
De acordo com os produtores da Tela Indígena, a valorização precisa acontecer dentro e fora dos territórios indígenas. “O álbum é um convite para outras formas de entender o mundo e as relações com as águas, florestas e ambiente. Tem um caráter criativo e formativo no qual os artistas indígenas conhecem, participam e conduzem todas as etapas”, afirma Geórgia Macedo, antropóloga e uma das integrantes da Tela Indígena.
As estreias acontecem a partir de 26 de julho, em Porto Alegre, na Cinemateca Capitólio, às 19h, e têm entrada franca (detalhes abaixo em Estreias). O projeto teve duração de seis dias de laboratório em cada território indígena e envolveu mais de 25 integrantes em um total de 15 meses de trabalho. A produção musical e edição de áudio é de Thiago Ramil e a identidade visual é da professora e artista indígena Vera Kaninhka e Amanda Teixeira. A idealização e realização é da Tela Indígena, formada pelos antropólogos Ana Letícia Schweig, Eduardo Schaan, Geórgia Macedo e Marcus Wittmann, juntamente com a líder indígena e Kujá Iracema Gah Teh.
O álbum conta com financiamento da Lei de Incentivo à Cultura (Lic) e patrocínio do Natura Musical, de um total de 33 projetos selecionados.
Estreias
Plataformas digitais (Spotify e YouTube): 26 de julho (quarta-feira)
Porto Alegre: 26 de julho (quarta-feira), às 19h, apresentação e conversa com pajés Entrada franca
Local: Cinemateca Capitólio (rua: Demétrio Ribeiro, 1085)
Brasília: 29 de julho (sábado), das 14h30 às 16h30, apresentação e conversa com pajés
Entrada franca
Local: Memorial dos Povos Indígenas (Zona Cívico-Administrativa, em frente ao Memorial JK)
Canela: 5 de agosto (sábado), às 15h, com projeções, dança e canto
Entrada franca
Local: território Konhún Mag (rua: Otaviano do Amaral Pires, 5000/ Flona)
Nonoai: 20 de agosto (domingo), às 19h
Exclusivo para comunidade indígena local
Local: comunidade indígena Nürvenh
Para saber: O povo Kaingang concebe dois tipos de água no mundo: Goj tej (água comprida, dos rios) e Goj ror (água redonda, as nascentes, os lagos). Essas águas são complementares, como toda a cosmologia Kaingang, e é na união e troca entre as duas metades que, de acordo com os indígenas, o mundo pode conquistar o equilíbrio. Não só as águas, mas todo universo Kaingang é dividido entre as coisas redondas (ror) e compridas (téj), assim como as pessoas que têm suas marcas passadas de pais para filhos, sendo divididos entre kamé e kajru. As metades (plantas, pessoas, animais e seres) possuem características e comportamentos próprios, e as metades vivem se complementando entre si.