Programação

Sala de Cinema

Horários

16/07/2022 • 17:00h

O Franco + Chircales

R$ 5,00
O Franco (Le Franc, dir. Djibril Diop Mambéty, Senegal/Suíça/França, 1994, 45min, 35 mm para DCP, filme restaurado pela Waka Films em parceria com o Laboratoire Éclair e a Cinémathèque Afrique, do Institut Français)

Chircales (dir. Marta Rodríguez e Jorge Silva, Colômbia, 1966-71, 42min, 16 mm para DCP, filme restaurado pelo Arsenal – Institut für film und videokunst e.V. em parceria com a Fundación Cine Documental)

O FRANCO

 

O Franco foi o último filme completado em vida pelo grande cineasta senegalês Djibril Diop Mambéty (1945-1998), conhecido melhor por Touki Bouki, a Viagem da Hiena (1973). Ele foi concebido como a primeira parte de uma trilogia inacabada de médias-metragens chamada “Histórias de gente pequena”, sobre as desventuras da vida cotidiana de senegaleses que vivem às margens da sociedade. Esta comovente comédia segue os percursos de Marigo (interpretado por Dieye Ma Dieye), um músico e residente de uma favela em Dacar que perde seu instrumento, o congoma (uma espécie de guitarra), por falta de pagamento do aluguel de seu quarto. A salvação potencialmente chega quando Marigo compra um bilhete de loteria vencedor, mas ele tem de entender o que fazer após grudá-lo com demasiada força atrás de sua porta. Ele corre pela cidade para tentar trocar o bilhete, em cenas que misturam surrealismo com realismo social. O filme foi inspirado na súbita desvalorização do Franco CFA da África Ocidental em 1994, e a ação transpassa sob a sombra de Yaadikoone Ndiaye, um bandido e herói nacional cuja imagem em um cartaz na casa de Marigo questiona a dependência dos senegaleses ao capitalismo.

Os negativos de O Franco e o segundo filme da trilogia, A Pequena Vendedora de Sol (1999), ficaram com Silvia Voser e Waka Films (http://www.wakafilms.net/), a produtora suíça da série. Enquanto A Pequena Vendedora circulava em cópias em estado razoável, por anos foi difícil de assistir uma versão de O Franco que fizesse justiça a seus brilhantes tons e texturas de vermelhos, amarelos e azuis. Isso mudou com a restauração dos dois filmes em 2K em 2018, um processo realizado pela Waka Films através do laboratório francês Éclair (cuja ala de restauração é hoje conhecida como L’Image Retrouvée: http://www.imageretrouvee.fr/) .

Logo, os filmes se integraram em um projeto de distribuição da Cinémathèque Afrique, um braço do Institut Français, junto ao órgão francês CNC (Centro Nacional de Cinematografia). O projeto, chamado “20 filmes para 2020” (https://ifcinema.institutfrancais.com/fr/cycle?id=fc6b82b9-b9e0-42a3-bc39-534e77c8c7a0), coloca clássicos restaurados do cinema africano (a maioria deles curtas e medias-metragens) em circulação não comercial em diversos países. A conclusão do projeto foi adiada por causa da pandemia, e ele atualmente conta com 16 filmes, que foram escolhidos em 2018 pelo Committee for African Cinematographic Heritage (CPCA), um comité de 14 especialistas em cinema africano cujas deliberações contemplaram títulos de 20 países. O projeto não guarda elementos originais dos filmes escolhidos, mas colabora com cinematecas e detentores.

A exibição de O Franco conta com o apoio do Institut Français e da Cinemateca da Embaixada da França no Brasil.

 

CHIRCALES

Em 1971, a antropóloga Marta Rodríguez (nascida em 1933) e o fotógrafo Jorge Silva (1941-1987) – ambos artistas colombianos dedicados ao cinema de documentário como instrumento de ativismo social – criaram a Fundación Cine Documental para registrar e denunciar os abusos de uma elite colombiana que explorava camponeses e dizimou povos indígenas. Eles colaboraram por mais de vinte anos, até a morte prematura de Silva em 1987, e realizaram sete filmes, de durações variadas, a partir de longos e rigorosos processos de pesquisa no campo e vivências entre as comunidades retratadas. Rodríguez continuou o trabalho em parcerias diversas, entre elas, com seu filho Lucas Silva, Fernando Restrepo, Felipe Colmenares e com associações de tribos indígenas como a ACIN e Çxhab Sala Kiwe, e registrou a violência do conflito armado entre paramilitares, guerrilheiros e traficantes de drogas que resultou no desalojamento de famílias de camponeses indígenas e afrodescendentes. Ela segue fazendo cinema até hoje.

 

A Fundación Cine Documental (https://martarodriguez.com.co/), que atualmente é cuidada pelos filhos e colaboradores do casal Rodríguez e Silva, também se dedicou à preservação de um inestimável arquivo de imagens fotográficas e cinematográficas da história da Colômbia desde os anos 40. Como parte deste esforço, criou parcerias para restaurar os filmes da família com instituições internacionais como o Arsenal – Institut für Film und Videokunst e.V. (Chircales e Nuestra Voz de tierra, memoria y futuro), o Festival Internacional de Curtas-Metragens de Oberhausen (Campesinos), e os laboratórios mexicanos Labofilms e Celuloide (Planas, testimonio de un etnocidio).

 

O primeiro projeto de restauração (concluído em 2014) foi do primeiro filme de Rodríguez e Silva, o media-metragem Chircales, que eles realizaram entre os anos 1966 e 1971. A restauração foi realizada como uma parceria entre a Fundación, o Arsenal e a Direção de Cinematografia do Ministério da Cultura da Colômbia. O material fílmico (dois negativos em 16 mm duplicados e um negativo de som óptico), que se encontrava em bom estado de preservação, foi enviado à equipe do Arsenal (https://www.arsenal-berlin.de/) pela Fundación. Rodríguez acompanhou o processo de restauração e digitalização do material em 2K, e um novo negativo em 35 mm também foi gerado para fins de preservação.

 

“Chircales” era o nome dado às propriedades de produção artesanal de tijolos existentes nas periferias de Bogotá. Nelas, havia um sistema de trabalho degradante onde o trabalhador, residente no próprio local de fabricação, era submetido a intensas horas de trabalho mal remunerado e vivia à mercê de arrendatários das terras, as quais pertenciam a membros de uma elite negligente. O filme acompanha o sombrio dia a dia da família Castañeda. O patriarca alcoólatra é debilitado por doenças pulmonares comuns ao ambiente da produção de tijolos, e a matriarca que, além de trabalhar na produção, precisa criar os 12 filhos, que variam entre jovens crianças e jovens adultos, todos destinados ao mesmo modo de vida. Apesar da dura jornada, há espaço para a fé religiosa, que funciona como uma fuga ocasional. O filme mostra a situação de seus personagens de forma impressionista, com extraordinária fotografia em preto e branco e longos períodos de silêncio entre os momentos de narração.

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